Por: Helena Rodrigues
O queijo Serpa é um produto tradicional certificado com Denominação de Origem Protegida (DOP) produzido no Alentejo. No processo de produção deste queijo é usado leite de ovelha cru e coagulante vegetal (extraído da flor do cardo Cynara cardunculus L.). O período mínimo de maturação é de 30 dias, não sendo permitida a adição de culturas de arranque nem a pasteurização do leite. Este é um dos queijos tradicionais portugueses mais reconhecidos, graças em boa medida às suas características sensoriais únicas e à sua extensa herança cultural.
Existem, no entanto, variações físico-químicas e microbiológicas resultantes, por exemplo, de algumas diferenças na composição do leite (dependentes da raça animal e da sua alimentação ao longo do ano) e de múltiplas particularidades nas práticas de fabrico. Estes e outros parâmetros resultam num produto final heterogéneo, que pode acarretar perdas económicas para o produtor quando envolve redução de qualidade, perda de certificação ou até levanta questões de segurança alimentar.
No presente estudo, realizado sob coordenação interna e orientação da Prof. Dra Manuela Pintado e orientação da Prof. Dra Freni Tavaria, ambas da Escola Superior de Biotecnologia, analisaram-se parâmetros reológicos e físico-químicos para identificar os que melhor distinguem os queijos Serpa DOP dos queijos com menor qualidade organolética e que, por consequência, não conseguem obter certificação. Estudaram-se exemplares de queijos Serpa produzidos por quatro produtores DOP distintos e em diferentes estações do ano. Todos os queijos foram classificados entre mau, bom e excelente por um painel de provadores certificados em análise sensorial. Os resultados comprovaram a elevada diversidade deste produto produzido com leite cru, em que nem todos conseguiram obter certificação DOP.
Mas o mais interessante foi as análises químicas pormenorizadas permitirem a criação de um perfil que identifica e distingue os vários níveis de qualidade do queijo Serpa. Através de consecutivas análises estatísticas os parâmetros selecionados incluem os ácidos propiónico, butírico, isopentanóico e dodecanóico, os aminoácidos tirosina, triptofano e isoleucina, a cetona 2-undecanona, o éster etil isovalerato, o teor de humidade isento de matéria gorda, o G’ 1 Hz, o índice de maturação e o rácio entre o azoto não proteico e azoto total. Em conjunto estes marcadores caracterizam os vários queijos de um modo que se alinha e corresponde às avaliações do painel sensorial.
Como valorizar o leite que não permite a produção de um queijo com certificação DOP? Uma opção é a pasteurização do leite conjugada com a seleção de microrganismos autóctones para o desenvolvimento de uma cultura de arranque. Embora este novo produto não possa ser comercializado como queijo Serpa DOP, este poderá ter características organoléticas bastante apreciadas e potencial adicional para mercados que restringem ou proíbem o uso de leite cru. Esta via tem potencial para apoiar o setor dos pequenos ruminantes e reduzir as perdas económicas dos produtores.
O artigo científico sobre este trabalho está disponível online: Araújo-Rodrigues H, Martins APL, Tavaria FK, Santos MTG, Carvalho MJ, Dias J, Alvarenga NB and Pintado ME (2022). Organoleptic Chemical Markers of Serpa PDO Cheese Specificity. Foods. 2022, 11(13), 1898. https://doi.org/10.3390/foods11131898