Por: Inês Ramos
Rocío Santiago Ramos, aluna do mestrado de Engenharia Alimentar da Escola Superior de Biotecnologia da Católica no Porto, desenvolveu um snack com 36% de bagaços de uva e tomate com o objetivo de criar um novo canal de valorização destes resíduos agrícolas.
Cada europeu deita fora aproximadamente 170 kg de alimentos todos os anos. Esta perda também representa desperdício de energia e recursos humanos, para além de contribuir para a escassez alimentar, alterações climáticas e inevitável subida dos preços. Em 2015 o desperdício de alimentos foi considerado uma prioridade no Circular Economy Action Plan da União Europeia, um roteiro para a economia circular.
Estima-se que só em Portugal se acumulem anualmente cerca de 200 mil toneladas de bagaço de uva. Tradicionalmente ele era usado para destilar vinhos fortificados, produzir fertilizantes ou incorporar nas rações animais. No entanto esses usos apresentam um lado negativo pois podem afetar o rendimento das culturas e o ganho de peso dos animais. Por outro lado o bagaço de uva é uma fonte de antioxidantes naturais e outros compostos que podem ser utilizados em alimentos, como compostos fenólicos, flavonóides e antocianinas.
Já o bagaço do tomate é composto por sementes, casca e polpa e tem um alto teor (59%) de fibra alimentar, 19% (peso seco) de proteína e carotenóides como o licopeno, um antioxidante que reduz o risco de aterosclerose e doença cardíaca coronária (e possivelmente também o de certos cancros). O destino típico é o descarte como resíduo sólido, embora às vezes seja usado para alimentação animal.
O snack desenvolvido, que além destes subprodutos incorpora também aveia, chia, quinoa, mel e manteiga de amendoim, é uma fonte de proteína, fibra alimentar e zinco, sendo pobre em gorduras saturadas e rico em ferro (de acordo com os critérios da FAO). Pode portanto ser considerado um produto saudável. A receita final foi avaliada como saborosa e saudável por um focus group e os sub-produtos presentes não foram identificados como tal. A qualidade do snack final foi avaliada relativamente aos parâmetros de textura (dureza, elasticidade, coesão, resiliência e mastigabilidade), atividade da água, composição de voláteis e diferença de cor total. Também foram efetuados testes durante um período de armazenamento de 5 semanas.
Este trabalho, realizado sob orientação da investigadora Doutora Inês Ramos e da Prof. Dra. Cristina Silva, não tem ainda uma versão comercial mas funciona como prova de conceito: é de facto possível dar segunda vida ao que parece destinado ao caixote do lixo.
Este trabalho foi sistematizado num artigo científico publicado em 2022 na revista Foods.